Há poucos dias, o ex-juiz federal e ex-ministro bolsonarista Sergio Moro se tornou réu na Justiça Federal: um juiz do Distrito Federal aceitou uma ação popular impetrada por cinco deputados federais do PT. Na ação, os parlamentares pedem reparação pelos prejuízos financeiros, políticos e morais que a conduta parcial de Moro causou ao patrimônio nacional enquanto estava à frente da operação Lava Jato. Essa notícia é mais um episódio importante na esteira frenética de acontecimentos desencadeados pela série Vaza Jato, iniciada pelo Intercept e que depois envolveu diversos veículos parceiros, e quero te lembrar por quê.
Em maio de 2019, a redação do Intercept recebeu de uma fonte anônima um arquivo digital gigantesco. Pouco depois, confirmaríamos que se tratava de conversas por aplicativo entre membros do Ministério Público Federal integrantes da Lava Jato, inclusive de um deles com o então juiz Moro. Ficou claro o que muitos analistas e críticos da força-tarefa já alertavam: Moro mantinha uma relação próxima e inadequada com a acusação, uma parceria em que o juiz dava orientações, dicas e até broncas nos procuradores, em prejuízo da defesa e da imparcialidade que se impõe ao julgador. Um escândalo.
Após tirar Lula das eleições 2018 e assim entregar de bandeja o pleito a Bolsonaro, Moro recebeu o convite para integrar o governo, como Ministro da Justiça e Segurança Pública. Moro disse sim a Bolsonaro exatamente um mês após levantar o sigilo da estapafúrdia delação premiada de Antonio Palocci (nem Deltan Dallagnol e Roberson Pozzobon foram capazes de defender a decisão do Russo, chefe informal de ambos). Na conversa com Bolsonaro, no condomínio que também é lar de milicianos na Barra da Tijuca, o então juiz pediu uma lei que garantisse uma pensão à família dele, vez que abriria mão das confortáveis regalias do emprego no poder Judiciário.
O ex-juiz deixou o governo, em abril de 2020, desmoralizado. Desde a Vaza Jato que Bolsonaro, até então intimidado perante o poderoso ex-Lava Jato, passou a dedicar a Moro humilhações públicas e negativas em série. Tirou dele o Coaf, vetou suas nomeações, interferiu na Polícia Federal. Durante a coletiva de despedida do cargo, Moro disse que teve apoio de Bolsonaro em alguns projetos, “mas em outros não”.
Ao longo das reportagens da série Vaza Jato, mostramos por que Moro passou da glória de estampar as capas da imprensa mainstream como o “salvador da pátria” a uma tentativa frustrada de se vender como “terceira via” presidencial em 2022 em uma candidatura que largou e morreu sem sair dos 8% das intenções de voto. Desesperado, Moro trocou de partido para ser humilhado e agora pleiteia a chance de concorrer a um cargo de menor expressão.
A mudança de status de Sergio Moro – ontem herói nacional; hoje, réu na justiça – não teria acontecido sem o jornalismo investigativo do Intercept. E, você sabe, há muito mais gente por ser desmascarada.
Rafael Moro Martins |